sábado, 7 de agosto de 2010

Bathory: a magia permanece

Após ouvir mais um habitual “Ricaaaaaaardo, telefone!!!”, proferido diariamente por minha mãe, atendi a ligação. “Fala Slayer! Chega aqui em casa que comprei um disco importado daquela banda que parece Venom”, disse meu amigo Claudio Fortuna. “Pô, legal! Qual disco é?”, indaguei. “Um que chama ‘Under The Sign Of The Black Mark’ e a capa é muito legal”, respondeu Claudio. Nem lembro o que estava fazendo naquela hora em casa, mas saí dizendo que tinha um “compromisso inadiável”. Afinal, estava prestes a ouvir o novo trabalho da “banda que parece Venom”, da “banda de um cara só”, da “banda do disco com a capa do bode”...

A ligação com o Bathory era grande desde o primeiro contato que tive com a banda, no lançamento do EP autointitulado de 1984. Lembro perfeitamente quando Serginho – hoje advogado de renome nacional – e Duda, amigos do time de futebol de praia do Guarujá, compraram “o disco do bode” importado e me enviaram pelo correio a gravação em fita cassete por fonopostal (!). É, quem reclama hoje que o “link está fora do ar” não faz ideia do que fazíamos para ouvir algo novo.

Também me recordo de ver o Paulinho “Pedrinho”, que fazia parte do time de basquetebol do clube Paineiras do Morumby na categoria do Conrado Tabuso, um dos editores do fanzine DeathCore, usando quase que diariamente a camiseta da “banda do bode”, com a capa do EP estampada. Nós até brincávamos que não íamos comprar a camiseta porque senão estaríamos “vestidos de Paulinho”.

Após os treinos e jogos do Paineiras – ou “Parna”, como chamávamos –, naquela fila para pegar o lanche, invariavelmente vinha o papo de quem era melhor – Bathory, Venom, Celtic Frost ou Hellhammer? Nunca quis entrar tão a fundo nessas discussões. Afinal, curtia da mesma forma todas estas bandas, mas sempre falava as mesmas coisas: “Ah, a música ‘Necromansy’ é a melhor do Bathory!” ou “O Venom que começou com isso tudo! Duvido que o Quorthon não tenha se inspirado na ‘In League with Satan’ para fazer a ‘In Conspiracy with Satan’”… Bem, eu falava tudo isso, mas bem lá no fundo eu já sabia que a minha preferida dentre estas era Celtic Frost mesmo. Era, ainda é e acredito que sempre será.

“Under The Sign Of The Black Mark”, o álbum que Claudio Fortuna e eu estávamos ouvindo pela primeira vez, era o terceiro da carreira do Bathory e foi lançado naquele mesmo ano, 1987. Passou o lado A, passou o lado B, mas a música que imediatamente curtimos foi a “Woman Of Dark Desires”, dedicada a Elizabeth Bathory. Ficou no ar a questão: “Quem seria aquela mulher?”... Como não havia internet, deixamos pra lá. Tempos depois, fui consultar algumas enciclopédias que tinha em casa – Barsa, Tudo... – e descobri que se tratava da Condessa Elizabeth Bathory.

O já falecido músico sueco Thomas "Quorthon" Forsberg (17 de fevereiro de 1966 — 7 de junho de 2004) inspirou-se em Erzsebet Báthory para o nome de sua banda. Nascida em 1560, filha de pais de famílias aristocráticas da Hungria, Elizabeth cresceu numa época em que as forças turcas conquistaram a maior parte do território húngaro, sendo campo de batalhas entre Turquia e Áustria.

Como conviveu com todo o tipo de atrocidades quando criança, Elizabeth desenvolveu um alto grau de sadismo. Mais tarde, se tornou uma das mais belas aristocratas e quem a via jamais poderia imaginar que, por trás daquela atraente mulher, havia um mórbido prazer em ver o sofrimento alheio. A Condessa ganhou a fama de ser "vampira" por morder e dilacerar a carne de suas criadas.

Casada com o Conde Ferenc Nadasdy, Elizabeth teve três filhas, Anna, Ursula e Katherina, e um filho, Paul. Após a morte de seu marido em 1604, mudou-se para Viena e daí para frente seus atos tornaram-se mais pavorosos e depravados. As investigações sobre os assassinatos cometidos pela Condessa começaram em 1610, ano em que foi presa e julgada.

Em janeiro do ano seguinte foram apresentadas como provas algumas anotações escritas por Elizabeth, contando com aproximadamente 650 nomes de vítimas mortas pela acusada. Seus cúmplices foram condenados à morte e a Condessa à prisão perpétua. Elizabeth foi presa num aposento em seu próprio castelo, sem qualquer contato com o mundo externo. Vivendo fechada num quarto, sem portas e janelas, apenas com uma pequena abertura para passagem de ar e comida, faleceu a 21 de agosto de 1614.

Não sou cinéfilo e não consigo guardar nomes de filmes e de atores que vi na semana passada, mas uma boa dica para se ter uma ideia de como foi a vida de Elizabeth é o filme “Bathory” (“Condessa de Sangue”, no Brasil), lançado este ano. Mesclando ficção e realidade, o filme dirigido por Juraj Jakubisco mostra como Elizabeth Bathory se tornou uma lenda. No elenco, Karel Roden, Vincent Regan, Haws Matheson, Deana Horváthová e Franco Nero. Coloquei por colocar, já que não faço a menor ideia de quem sejam estes atores, OK?

Os anos passaram, os nossos gostos musicais foram se ampliando, mas aquela magia em relação ao Bathory permaneceu – pelo menos pra mim. Quando montei a banda Midnight com o vocalista Roger Lombardi, sabia da admiração dele em relação a estes mesmos grupos. Chegamos a gravar um CD com o Sunseth Midnight e quando ele saiu para montar o seu próprio projeto, veio com o nome Goatlove – goat que, na tradução literal, significa bode (ou cabra). O som da banda não tem nenhuma ligação com o Bathory, mas com o The Cult, que também tem seu disco “da capa do bode” e outro intitulado “Love”. Entretanto, bastam cinco minutos de papo com ele para perceber que o Bathory é uma referência, mesmo que implícita, assim como o Celtic Frost, Hellhammer, Venom e tantos outros. É, parece que a magia em relação ao quarteto “Bathory-Venom-Celtic Frost-Hellhammer” perdurará.