terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Azar?

Tudo corria bem na volta do "Wacken Open Air" (ALE) até que chegou o momento de fazer uma conexão no aeroporto de Heathrow, em Londres. A companhia aérea British Airways atrasou o voo vindo de Frankfurt e quando saíamos da aeronave foi aquela correria. Não estou dizendo "correria" no sentido figurado, mas literalmente, pois todo o grupo saiu de forma insana como se estivesse disputando uma prova olímpica. Resultado: perdemos a conexão e vimos o avião da Varig decolando. Imagine a sensação. Agora, imagine você a alegria de não ter um centavo no bolso, dentro de um aeroporto gigante, de madrugada e sem saber o que fazer. Mas que azar, pensei...

A fila do desembarque e a passagem pela imigração ainda revelaram grandes emoções, com um outro voo vindo de algum país do Oriente Médio. Óbvio que havia tensão no ar. Aí, comecei a falar ao meu amigo Carlo Antico: "Fudeu, oIhe pra trás!" Ele, com toda sua tranquilidade, só teve tempo de rir e falar: "Calma, meu". Tudo bem, segui com minha apreensão e passamos sem grande problemas, com Airton Diniz, que liderava aquele pequeno grupo da revista Roadie Crew com a Maria José e a Vera Diniz, explicando a nossa situação.

Depois foi aquele sufoco até conseguirmos falar com algum funcionário da British Airways, com diversos setores do aeroporto às escuras. Felizmente, uma portuguesa que trabalhava na companhia entendeu nosso desespero e agilizou para que conseguíssemos um táxi para ir ao hotel – com todas as despesas pagas pela empresa aérea. No começo ela só falou em inglês, mas "alguém" (eu mesmo!) falou algumas palavras mais fortes – "Fudeu! Olha que merda essa British Airways! E agora?" – e a funcionária, de repente, começou a nos entender melhor. A Maria José brincou comigo, dizendo: "A sua braveza deu sorte pra gente, Batalha!" Depois, caímos na risada.

A "tuga" ajudou, fez todo o trâmite e, enfim, pegamos dois táxis. O meu, junto com um casal de norte-americanos. Claro que fui direto para o lado do motorista achando que já ia sentar, mas aí todos riram alto e os americanos falaram: "We're in London". O motorista só deu uma risada e disse: "Yes, mate. This is my seat". Claro que fiquei com cara de otário e falei: "Sorry. I prefer to sit in the passenger's seat". Mancada inesperada mas corriqueira, segundo o "motora". Todos riram e fomos parar no hotel Renaissance, que não ficava tão longe. É, só no dia seguinte descobri que ficava longe de tudo, porque se era perto do aeroporto é óbvio que ficava bem afastado de Londres, a cerca de 25 quilômetros.

Instalados no quarto do hotel, que se seu fosse pagar a estadia estaria parcelada até hoje, falei para ao Carlo Antico que como eles pagariam tudo, podíamos comer. Pedimos duas pizzas pelo telefone, comemos e "desmaiamos" de cansaço.

No dia seguinte estávamos "livres" e o pessoal resolveu fazer um city tour por Londres. Tudo bem, eu disse que não tinha um centavo, mas tinha só o dinheiro (em real) para pagar o ônibus do aeroporto de Cumbica até Congonhas e uns trocados para o café e o cigarro. Se não fosse pela ajuda do Carlo, que bancou meu city tour, o meu sonho de infância em conhecer Londres não seria realizado. Desde os acontecimentos em Heathrow, Carlo – que apelidei de "Coleção" pela sua incontrolável mania de comprar CDs "para a coleção" – era o mais sossegado e estava curtindo ter perdido a conexão, enquanto eu estava apavorado pensando que ia ter que "dormir" no aeroporto.

Só quando o táxi que nos levou para o city tour estava próximo a Londres comecei a curtir. Comecei a lembrar de todos os amigos que moraram – ou moram – por lá ou que costumam visitar a cidade com frequência. Lembrei-me dos primeiros anos estudando na Cultura Inglesa e de guardar recortes de reportagens sobre Londres. Para ser bem sincero, eu torrava a paciência do meu falecido pai falando que eu queria ir para Londres. Bem, não deu antes, mas deu na sorte! Não foi possível conhecer toda a cidade, o que já era de se esperar de um rápido city tour combinado às pressas, mas pudemos ver locais históricos como o Royal Albert Hall, Palácio de Westminster – "Crianças, vejam o Big Ben!" –, Tower Bridge, Torre de Londres, Museu de História Natural, Hyde Park e, obviamente, o Abbey Road Studios.

Tudo me impressionou, mas a alegria de ver dois 'beatlemaníacos' como Airton Diniz e Carlo Antico na Abbey Road e em frente ao Abbey Road Studios foi indescritível. Porém, ao invés de tirar fotos na rua (Abbey Road) ou de escrever no muro como fazem os fãs dos Beatles, meu negócio era ver o estúdio. Entrei na recepção e joguei um xaveco que não colou. Vi muito pouco, já que não me deixaram entrar nas salas porque duas bandas estava gravando naquele momento. Enquanto isso, os fãs de Beatles estavam na Abbey Road que, ao contrário do que parece pela capa do álbum em que Paul, George, Ringo e John aparecem atravessando a rua, é muito movimentada. Os ingleses estão acostumados, mas não curtem muito aquele vai e vem de turistas loucos no meio da rua.

Depois do Abbey Road voltamos ao hotel, sem antes passar por um grande apuro com o sonolento motorista ao volante. Na "marginal" a caminho do hotel, ele simplesmente colocou o carro no "piloto automático" e cochilou por várias vezes. Enfim chegamos e, em seguida, nos preparamos para retornar ao aeroporto de Heathrow. De lá, saímos sem grandes problemas para Cumbica. Eu, claro, com 1m90 e sempre sentado na pior assento do avião. Mas valeu, mais um sonho de infância realizado e o azar virou sorte.

Resolvi postar esta história porque hoje, 23 de fevereiro de 2010, o estúdio Abbey Road foi classificado pelo governo britânico como sítio histórico, visando proteger o santuário da música Pop contra quaisquer planos de modificações radicais no imóvel.

Seguindo o parecer do organismo de preservação nacional English Heritage, a ministra britânica da Cultura, Margaret Hodge, situou o estúdio na segunda mais alta categoria de locais a serem preservados. Ao tombar o edifício no Grau 2, poderão ser feitas modificações no interior do imóvel, mas quaisquer reformas propostas terão que respeitar o caráter e a preservação dele.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Black Sabbath: primeira obra do Heavy Metal chega aos 40 anos

No post de 23 de novembro de 2008 ("Volume 4: a descoberta") falei sobre o meu primeiro contato com o Black Sabbath e, por consequência, com o Heavy Metal. Sendo assim, esta data não poderia passar em branco pois, curiosamente, aos 40 anos de idade vejo o primeiro álbum lançado por Ozzy Osbourne, Tony Iommi, Geezer Butler e Bill Ward também chegar a esta marca. Em sentido amplo, o Heavy Metal faz quarenta anos hoje: 13 de fevereiro de 2010.

Alguns estarão curtindo o feriadão de Carnaval, mas fiquemos aqui reverenciando esta obra fantástica e misteriosa, que serviu de referência para todos os seguidores da música pesada. Abaixo, reproduzo o texto publicado na edição #100 da revista ROADIE CREW sobre o álbum "Black Sabbath".

Sexta-feira chuvosa, dia 13 de fevereiro de 1970. A noite cai e os vestígios da escuridão se amoldam às árvores escurecidas. A longa noite macabra se inicia. Ainda perto da lagoa uma jovem garota espera. Ainda que ela acredite ser ela mesma etérea, sorri tenebrosamente ao tocar de sinos distantes. De repente, um calafrio da cabeça aos pés. O que é isso que se levanta à minha frente? Um vulto preto que aponta para mim. Viro rapidamente e começo a correr. Descobri que sou o escolhido. E a chuva continua caindo...

Sob este contexto, com uma proposta macabra e soturna, o Black Sabbath gravou seu álbum de estreia. Tendo uma mesa de quatro canais à disposição no Regent Sound Studios – localizado na Tottenham Court Road, em Londres (ING) – e com 600 libras inglesas para gastar, Ozzy Osbourne, Tony Iommi, Geezer Butler e Bill Ward montaram seus equipamentos como se fossem fazer um show. Os músicos, que àquela altura faziam shows seguidos mas tinham pouca, ou quase nenhuma, experiência de estúdio, gravaram o álbum ao vivo e em poucos takes.

O produtor Rodger (Roger) Bain também estava fazendo seu 'batismo de fogo', sendo esta a primeira experiência para uma grande empresa fonográfica. As composições não foram mexidas, mas os efeitos (sino, trovão, chuva, entre outros) foram sugeridos por Rodger e pelos engenheiros de som, Tom Allom e Barry Sheffield. Todos realmente entraram no clima naqueles três dias - 16 a 19 de outubro de 1969 – e Rodger ainda gravou a harpa judaica ('kakei') da faixa "Sleeping Village".

"Black Sabbath" resumiu-se a sete faixas (oito no relançamento em CD), todas envolventes. O disco abre com pesada e cadenciada faixa título, tendo um clima condizente com a proposta sombria. O track list ainda traz "The Wizard", "Behind The Wall Of Sleep", "N.I.B.", "Evil Woman" (cover da banda Crow), Sleeping Village, Warning (cover do Ansley Dunbar's Retaliation) e "Wicked World".

O trabalho veio embalado com uma misteriosa arte – comandada pelo artista Marcus Keef –, que na primeira (e rara) edição ainda trouxe o desenho de uma cruz invertida no encarte com os dados técnicos e o poema "Still Falls The Rain" inscrito no corpo da cruz.

Para a promoção, o empresário Jim Simpson e os funcionários da gravadora Vertigo decidiram lançar um compacto com "Evil Woman" e "Wicked World". Enquanto o Lado B com "Wicked World" fez sucesso, "Evil Woman" foi renegada pelo quarteto.

"Black Sabbath" alcançou o 8º lugar nas paradas do Reino Unido e a 23ª na Alemanha, mas a obra foi além, sendo o marco zero do que viria a ser classificado como Heavy Metal.

Curiosidades:
A casa de aparência mal assombrada que aparece na capa é um moinho histórico que se localiza na vila de Mapledurham, em Oxfordshire/ING (www.mapledurham.co.uk). A imagem da "bruxa", no entanto, ninguém sabe ao certo e cogita-se que teria sido uma atriz contratada para a sessão de fotos;

Na contracapa do LP, Ozzy veio impresso como Ossie Osbourne;

"N.I.B." não significa "Nativity In Black" e nem "Name In Blood". O título faz referência ao apelido dado a Bill Ward por causa de sua barba, que parecia uma ponta de caneta ('pen nib');

"Behind The Wall Of Sleep" tem ligação com a obra de H.P. Lovecraft ("Beyond The Wall Of Sleep);

A gaita tocada por Ozzy em "The Wizard "foi incluída durante as sessões de estúdio por acaso, após Iommi e Butler terem o escutado tocando-a de forma descontraída, como fazia nas longas jams desde os tempos em que atendiam pelo nome Earth;

A reação do pai de Ozzy, John Thomas Osbourne, ao ouvir o LP foi: "Você tem certeza que só anda fumando cigarro?", e ele ainda fez uma cruz de alumínio e uma corrente de pescoço para Ozzy, Iommi, Ward e Butler "para afastar os maus espíritos";

No local onde ficava o Regent Sound Studios hoje existe uma agência do Abbey Bank.