sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Arquivo Entrevista: BLACKIE LAWLESS (W.A.S.P.)

A banda norte-americana W.A.S.P. vem se destacando no cenário mundial desde o início dos anos 80, ficando com a marca de inimigo público número 1 para os críticos e parte da sociedade norte-americana, incluindo uma estranha associação chamada PMRC (Parent's Music Resource Center), que visa proteger filhos de famílias conservadoras de "atentados musicais", como o Heavy Metal. Apesar dos detratores, Blackie Lawless & Cia. seguem em frente apresentando seu mais recente trabalho, "Unholy Terror", que saiu pela Metal-Is Records, a gravadora que agora é propriedade da Sanctuary Music, agência que cuida da carreira de nosso entrevistado o líder, baixista e vocalista Blackie Lawless.

Qual o significado do título "Unholy Terror"? De onde você tirou esta idéia?
Blackie Lawless: De minha educação religiosa. Eu tive um contato muito forte com a igreja até meus 18 anos. Entrei por vontade própria, ninguém me mandou. Eu estava buscando respostas que não conseguia encontrar, mas fiquei realmente frustrado e deixei a igreja. Depois pratiquei o ocultismo durante três anos, mas percebi que tinha trocado uma religião por outra. Não estou aqui para bater de frente contra qualquer religião ou o que são as suas convicções, estou tentando fazer com que as pessoas busquem suas próprias respostas. Veja bem o que as religiões organizadas estão fazendo em nome de Deus, criando guerras e coisas assim. Esta nunca foi a pretensão de Deus, ele não queria nada disso. Não sou dizendo que sou contra a religião de ninguém, sou apenas um opositor. Quero que as pessoas procurem por suas respostas e não fiquem fazendo o que as igrejas mandam fazer. Tire suas próprias conclusões.

Posso dizer que com esta temática do álbum você está ignorando as ironias?
Blackie: Não sei se eu diria isto, estou apenas tentando passar o que aconteceu comigo para que isto não aconteça com outras pessoas. A idéia básica do álbum é pensar por si só, a moral da história é procurar respostas para as suas próprias dúvidas. E quero ser bem claro e reforçar que isto não tem nenhuma conexão em atacar o credo e a ideologia de qualquer pessoa, porque este é um tema que não se prende somente ao lado religioso, o governo também faz isto. Sei que estou sendo até repetitivo, mas atente para isto e não faça o que os outros mandem ou ordenem que você faça por acharem que é o certo, o verdadeiro. Procure encontrar a sua verdade.

Por que você sempre aborda temas controvertidos? 
Blackie: Eu gosto de tudo que todo o mundo gosta. Eu imagino que o que me move e me motiva provavelmente moverá e motivará outros. Há uma faixa chamada Loco-motive Man, sobre um garoto que vai para a escola e tenta cometer assassinato seguido de suicídio. Isso é um assunto bastante quente. Para mim, o garoto é o sintoma, não a doença. A doença é o que os pais não estão fazendo para a criança. Note quantos artistas já foram processados por pais de crianças que cometeram suicídio. Eu não quero soar frio, mas o que os pais estão fazendo após a morte dos filhos é a mesma coisa de quando a criança ainda estava viva: nada é em benefício do filho. Eles se recusam a aceitar responsabilidade pelo que aconteceu. Mesmo com a morte, ainda estão apontando o dedo para outra pessoa, quando foram eles não deram para a criança o que ela precisava. Todo o artista ao fazer um trabalho está concedendo um grande presente. O presente não é o talento que você possui, o presente é que você pode estar onde as pessoas podem falar com você ou você está em uma plataforma e muitas pessoas o escutarão.

Como você analisa o novo álbum musicalmente? Vocês chegaram a gravar algum cover para ser lançada posteriormente?
Blackie: Você sabe que não costumamos fazer mudanças bruscas em nossa música e acredito que seja uma mistura de nosso primeiro álbum com o "Headless Children". Desta vez preferimos não gravar nenhum cover, somente as músicas que estão no álbum foram gravadas.

Você tenta fazer cada álbum soar diferente intencionalmente ou é uma progressão natural?
Blackie: Acho que isso é um pouco natural. Quando começo a fazer um álbum eu não sei como isso vai ficar no final. Pelo menos enquanto não tenho 2/3 do trabalho já terminado. Quando eu estou fazendo um álbum apenas tento descobrir o que vai pelo meu subconsciente. É um processo ininterrupto de captar o que já está lá. No final, fico quase tão surpreso com o resultado quanto qualquer outra pessoa.

Qual música nova irá para as rádios? 
Blackie: Ainda não sabemos. Estou pesquisando porque ainda não estou seguro. Eu tentaria primeiramente "Let It Roar", embora pessoalmente goste de  "Hate To Love Me". Mas eu simplesmente não me preocupo com uma faixa específica para o rádio.

Como está o trabalho com a Metal-Is Records? Você tem maior controle da criatividade do que teve com a Capitol Records?
Blackie: A Sanctuary Music está me empresariando desde 1983 e queríamos fazer uma gravadora há muito tempo. Era um antigo sonho que conseguimos realizar com a Metal-Is e espero que isto seja bom para todos nós. Na Capitol, éramos uma das poucas bandas a ter liberdade. Com toda honestidade, eu vivi lá um período em que fomos muito protegidos. Durante todo o tempo em que estivemos na Capitol, por seis vezes alguém da gravadora caiu fora da empresa. Quatro vezes eu os convidei a sair e duas vezes eles simplesmente apareceram e depressa perceberam que eu não estava contente com a presença deles por lá. Nunca, enquanto nós estivemos na Castle ou na CMC, alguém se importou conosco. Com a Capitol, eles nunca souberam o que eu estava fazendo. Assim eles decidiram me deixar sossegado. Isso não acontecia até seis ou sete anos atrás, quando tive uma conversa com Sammy Hagar sobre isto e ele mencionou ter sempre alguém se rastejando atrás dele na gravadora. Eu comecei falando às pessoas sobre isto e acabei ficando mais exposto. Eu estive por muito tempo como que em uma ilha deserta.

Você tem mais controle sobre suas masters e o material gravado? 
Blackie: Provavelmente a diferença maior é você consegue que as pessoas façam mais do que eles lhe contam eles vão fazer. Você pode participar de uma reunião de marketing por um dia inteiro mas a menos que alguém de dentro da gravadora tenha participado também, essa se reunião é puro desperdício de tempo. Parece uma coisa pequena mas realmente é enorme. Fora isso não há uma diferença muito grande.

No Brasil, o primeiro álbum do W.A.S.P. causou um grande impacto, mas qual o trabalho que fez o nome da banda ser forte no mundo todo?
Blackie: Não foi só ai que isto aconteceu, em outros países o impacto foi altamente positivo e era algo que não esperávamos na época, mas, provavelmente o álbum que colocou o nome da banda em evidência foi o "Headless Children".

Você acredita que as bandas alternativas podem ser consideradas como Heavy Metal e o que você pensa quando classificam bandas como o W.A.S.P. de "Retro Rock"?
Blackie: Uau!! Não sei ao certo, mas estas bandas não soam como o verdadeiro Metal para mim. Minha opinião não é a única que importa, cada pessoa que ouve estas bandas tem sua própria opinião. O que é Heavy Metal tradicional? Óbvio, Black Sabbath e Judas Priest. Para mim ser classificado como Retro Rock não significa nada, eles não estão me magoando porque nem ligo. Nada melhor que um dia após o outro.

Você conhece a cena do Black Metal? Estou dizendo isto porque muitos músicos deste estilo admiram o trabalho do W.A.S.P..
Blackie: Conheço alguma coisa de Black Metal porque sempre gosto de estar sabendo o que está acontecendo na cena em geral. O grande problema neste caso é que passamos tanto tempo concentrados no estúdio na época das gravações que não temos tempo de dar uma pausa para saciar o nosso lado de fã. Só para exemplificar o que estou dizendo, o "Unholy Terror" levou 14 meses para ficar pronto e quando estou trabalhando num álbum quase nem tenho oportunidade de ouvir outras bandas. A única chance real é quando estamos tocando em festivais, pois gosto de observar as bandas que tocam conosco, não só a música, mas tudo que envolve o show. Na verdade eu gostaria de conhecer bem mais bandas do que conheço. Sei que as pessoas podem pensar, vá a uma loja de CDs e compre alguns álbuns, mas não é bem assim...

Qual sua opinião sobre a MTV e o VH1?
Blackie: A MTV dos anos 80 e a MTV de agora são duas estações completamente diferentes. Na América nos anos 80 era realmente muito boa e agora é diferente, especialmente porque eles fecham as portas para o Heavy Metal. Mas, tudo evolui e eles têm que fazer o que acham ser melhor para eles. A VH1 é uma extensão disso que a MTV faz. Estão todos debaixo do mesmo telhado, no mesmo barco.

Você tem intenção de fazer um filme mostrando o que acontece "por trás" do mundo da música? 
Blackie: Muita gente tem me perguntado isso. Algo como querendo saber quantas pessoas conheci que morreram de overdose de droga. Acredite ou não, nosso espetáculo ao vivo é grande e bombástico, mas atrás disto a nossa vida é enfadonha. Nós nunca tivemos qualquer tragédia. Eu não sei se nossa carreira faria uma história boa ou não. Algo como uma subida ao topo, dependência de droga, e a perda de tudo... Eu simplesmente tenho sido um cara de muita sorte e nunca tive nada a ver com esse tipo de drama.

E quanto a Chris Holmes, ele está "limpo", careta e livre dos problemas com o álcool?    
Blackie: Chris ainda é Chris (risos). Ele sempre será assim, faz o que quer e se é assim que deseja, tudo bem. Já tivemos alguns problemas com isto, mas é a vida dele, não quero me interferir no aspecto pessoal.

Como está o cenário de palco do W.A.S.P. atualmente, vocês ainda utilizam o mesmo aparato visual e os elementos teatrais que costumavam usar? Rod Smallwood ainda costuma ajudá-lo na criação da estrutura do cenário?
Blackie: O show do W.A.S.P. sempre é grande, sangrento, bombástico e para cima. É um grande evento e ainda contamos com todo este aparato visual. Se não fizéssemos mais isto, não seríamos mais o W.A.S.P.! Gostamos de tocar bem alto e de contar com vários outros elementos além da música. Com relação a Rod, ele já me ajudou e sempre costumamos trocar algumas idéias sobre a criação de nossos cenários de palco.

Você sente que esteja havendo uma perda da energia que existia em espetáculos ao vivo? 
Blackie: Ao contrário. Acredito que parece estar havendo um renascimento de bandas que estão voltando a fazer coisas visualmente atraentes. Esta coisa visual no Rock parece acontecer em ciclos. 

Em 1987 as pessoas levavam o Rock'n'Roll tão a sério que o W.A.S.P. teve problemas com a organização PMRC, mas você não acredita que a música "Fuck Like A Beast" pode ser considerada inocente hoje em dia?
Blackie: Voltamos ao questionamento pessoal de cada um. Naquela época "Fuck Like A Beast" era considerada um afronte para muitas pessoas, mas, hoje em dia não parece ser tão perigosa. É uma questão de julgamento.

Então, qual é a importância da imagem do W.A.S.P.?
Blackie: A imagem da banda, o produto é importante, porque existe uma controvérsia criativa que tem continuidade e tem conteúdo artístico. 

Como você explica sua longevidade?
Blackie: Contando a verdade. Fazendo a melhor música que posso, mas falar a verdade é realmente o mais importante ou, pelo menos, o que eu acredito seja a verdade. Se não for assim, você está mentindo e não significa nada. Eu sei que tem alguns sujeitos que não são artistas, apenas gravam álbuns. Tudo bem,  mas não é isso que quero fazer. Qualquer artista que esteja há tanto tempo nisso sempre esteve tentando fazer com que o público acredite nele. 

Sendo um famoso rockstar em todo o mundo, qual é sua grande ambição daqui para frente?
Blackie: Gravar o melhor álbum que puder compor! Este é o ponto primordial e fundamental para mim, porque somente através de minha música gravada é que serei lembrado, mais importante do que os shows e outras coisas. Quando encerrar minha carreira sobrará minha música, serei lembrado por minhas gravações, por isso me concentro muito nas gravações de um álbum, dou o máximo de mim. Temos que ter respeito pela música para que o resultado final seja o mais satisfatório possível.

Como seus críticos afetam sua forma de compor? 
Blackie: Eu nem mesmo me preocupo com isso. Meu trabalho é fazer os melhores álbuns que eu possa. Sempre foi assim desde o princípio. Tenho uma carreira que se desenvolveu assim, como uma criança que aprende sem precisar ir à escola. Não preciso me preocupar com os críticos.

Quando se dará início a nova turnê? Vocês têm planos para tocar na América do Sul, especialmente no Brasil?
Blackie: Calculo que começaremos a turnê no princípio de maio e imagino que estaremos na estrada por cinco a seis meses. Ainda estamos negociando. faz pouco tempo que finalizei o álbum e, por isso, tudo que se refere a turnê, ainda estamos nos preparativos iniciais. E nem me fale em ir à América do Sul, pois faz muito tempo que estou querendo isto e nunca acontece. Preciso achar o promotor de shows certo para que ele possa viabilizar uma turnê pela América do Sul. Se você conhecer algum, por favor, diga isto a ele?! Seria importante e gratificante tocar aí.

Mas eu insisto sempre... Bato tanto na mesma tecla que acho até que já quebrei-a!
Blackie: (risos) É bom saber disto, muito obrigado... Mas, continue falando!

Qual será o futuro do W.A.S.P.? 
Blackie: Não tenho nenhuma idéia. Nosso primeiro álbum saiu 17 anos atrás. Se alguém me falasse que nós existiríamos 17 anos depois eu teria dado gargalhadas! Como lhe disse, a única coisa sob meu controle é fazer os melhores álbuns possíveis, continuar meu caminho e o que tiver que acontecer acontecerá. Eu gostaria de continuar fazendo isto até o dia em que não tiver deixado nada por dizer.

Entrevista publicada na edição #28 da revista ROADIE CREW (abril de 2001)

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