
A grande maioria dos que compareceram ao "Maquinaria Rock Fest", realizado a 17 de maio último, pode nem ter noção de que o festival que reuniu nomes como Sepultura, Ratos de Porão, Korzus, Threat, Matanza, Biohazard, Suicidal Tendencies, Misfits, Tristania e outras, só foi possível por causa daquela fusão ocorrida em 1987 com a união do Sepultura e Ratos de Porão. E olha que as datas disponíveis para Metal no Mambembe nem eram sextas ou sábados à noite e sim às segundas ou terças!

No Rio de Janeiro, graças à Dorsal Atlântica, a coisa era diferente. A própria Dorsal tinha uma alma Hardcore em seu som e o público naturalmente herdou (ou "roubou", como diria o guitarrista/vocalista Carlos Lopes) as tradições dos shows Punk. Lá no Rio, à época do também saudoso Caverna 2, as rodas de pogo eram comuns. E o "bater correntes" no chão da "turma do fundão" na pista do Caverna era algo chocante para os forasteiros. Pude ver isso de perto, mas vou contar esta história numa próxima. O problema lá no Rio era outro: Zona Sul X Zona Norte (Era?!...).

Mas eu tinha uma preocupação: a bateria da minha velha câmera Panasonic VHS, que agora é peça de museu. Só que aquele trambolho pesado tinha me feito entrar no circuito do Metal, algo que eu sempre desejei. Claro que não fiquei parado, só ansiando por algo. Fui atrás e o primeiro passo foi partir para as filmagens de shows e a edição de fanzines. Nunca quis ser músico e a bateria era apenas mais uma ação. Eu queria estar no meio, queria participar, reportar e ajudar aquilo tudo crescer.

Mesmo com esta ligação direta e a afinidade mútua na musicalidade do Punk e do Metal, ninguém ousava "invadir" o espaço de outro. O simples fato de ter cabelo comprido e usar uma camisa do Riistetyt (que me foi dada pelo Jaime) era

Esse lance todo de Metal X Punk era tão radical, "xiita" (como Carlos Lopes da Dorsal costuma falar) e confuso que o Caio Tabuso do DeathCore Zine certa vez foi proibido de entrar no escritório da revista Rock Brigade simplesmente porque estava com a camisa do Sex Pistols. Se eu ou o Caio fomos ingênuos ou contestadores não importa. Aquilo foi ridículo, mas o establishment (como diria o cronista esportivo Milton Neves) era assim. Da mesma forma causava estranheza ver um Punk moicano usando uma camiseta do Motörhead ou do AC/DC. Mas não estávamos nem aí. Ouvíamos o HxCx finlandês, alemão e continuávamos gravando fitas do Discharge, Stiff Little Fingers, The Exploited, English Dogs, Sham 69, Minor Threat, Varukers... Gravando, comprando e lendo todos os fanzines Punk. E nada batia os Zines Punk!

A situação era realmente complicada, mas descemos na estação Paraíso e fui na boa carregando aquela malinha Tiger fajuta com a câmera Panasonic. A preocupação logo deu lugar ao papo sobre música. "Será que o Sepultura vai tocar aquele som do Demo-Tape que você tem?", questionou Fanin a respeito da música The Past Reborns The Storms (http://www.youtube.com/watch?v=viAOdgmGOPI), que depois ficou conhecida como From The Past Comes The Storm e saiu no disco que o Sepultura estava para lançar, o excelente Schizophrenia.

O Sepultura e o Ratos de Porão estavam interessados em quebrar barreiras e fazer valer o ditado de que "a união faz a força". Na realidade, primeiramente por amizade. João Gordo e o Sepultura se encontraram em 1986, em Belo Horizonte (MG), quando o vocalista do RxDxPx viajou para ver os shows do Venom e Exciter, com abertura do próprio grupo dos irmãos Cavalera, Max e Igor. Posteriormente, integrantes do Sepultura apareceram entre os convidados especiais do terceiro 'full lenght' do RxDxPx, Cada Dia Mais Sujo e Agressivo.

(http://revistatrip.uol.com.br/76/cd/home.htm)
Os shows foram absurdamente intensos, penso que um dos mais furiosos da carreira do Sepultura e do RxDxPx. Gordo inclusive fez questão de discursar sobre a possível invasão dos skins. Quem temeu, perdeu aquelas apresentações históricas. Acredite ou não, aquele show mudou a cara do Metal brasileiro. O sentimento de sair do Mambembe e falar "Eu vi isso acontecer" deu um outro sentido na vida de todos que compareceram.
Nenhuma briga ocorreu, mas no final do evento o proprietário da Woodstock Discos, Walcir Chalas, caminhou com boa parte do público até a estação do metrô Paraíso no melhor estilo "líder de gangue". Ele foi à frente como se fosse um investigador de Polícia. Até hoje ele vai falar que não carregava arma de fogo alguma, mas então se alguém plantou o boato, funcionou.
Voltamos para casa e eu logo fui ver o registro em vídeo. O som do VHS tinha ficado legal, mas a imagem estava meio escura, porque lá não tinha jeito. A iluminação era fraca mesmo. O Ayala fazia tudo que podia com o equipamento que tinha à disposição, mas quase sempre a imagem ficava escura. Só que eu preferia ver tudo preto e ainda ter isto em mãos. Dizem as más línguas que a fita original foi parar nas mãos do baterista do RxDxPx e nunca mais foi recuperada (muito embora existam sites com o DVD deste show do Ratos à venda). Mas eu e o Fanin temos isto na memória. Daqui ninguém tira estas lembranças e o "perigo" de ir ao show virou motivo de orgulho. Nós vimos o surgimento do genuíno "Crossover Tupiniquim".
Sites relacionados:
www.myspace.com/ratos
sepultura.uol.com.br
Bacana ler sobre esse assunto. Não tive uma "oportunidade" como essa, mas quando comecei meu fanatismo por Heavy Metal, ainda criança, me lembro exatamente dessa "rixa" medonha entre punk e metal.
ResponderExcluirE lembro que passei a ouvir Ratos de Porão justamente por gostar de Sepultura e por ter lido sobre esse laço entre eles.
Infelizmente eu não estava la, mas suas palavras me traz boas lembranças do "meio metal" que até hoje persiste em minha vida, hehehe.....
Ratos e Sepultura, realmente um evento histórico. Pela primeira vez presenciamos "heavy" e "punk" juntos se preocupando exclusivamente em curtir um som, no entanto eventos como este sempre ajudam a refletir mais sobre o que realmente de fato importa para as pessoas que têm várias coisas em comum.
ResponderExcluirJoão Gordo teve coragem e atitude e sua forte personalidade o ajudou a enfrentar vários obstáculos. Depois deste evento histórico, o Batalha e trabalhou numa CIA de Cinema e Vídeo, era Editor Chefe de Imagens e Redação, cobria eventos de shows e eu fazia uns bicos como auxiliar de câmera, e tive a surpreza de participar acredito que uma das primeiras entrevistas que o Ratos dava para TV, esta materia foi feita após um show no Dama Shock, e foi veiculado na TV Gazeta, parabéns ao Ratos de Porão, Sepultura e todos aqueles que de alguma maneira contribuiram pela fusão de vertentes em prol do mesmo objetivo. E se alguém tem dúvida que o Batalha alguma vez foi contra está enganado, pois além de ser testemunha tem muita banda ai que pode dizer o quanto ele ajudou tanto na divulgação como resenhas e coberturas de shows.
Abraço!
Muito boa a história. O mais interessante é a relação entre Ratos e Sepultura. Destaque também por não terem dado à mínima para os boatos dos "temidos" Skins, importando somente a música e o amor por aquilo se gosta!
ResponderExcluirParabéns Ricardo...
Digno de apluasos!
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Eu estava nesse show e a cada palavra profeciada pelo Batalha me fizeram relembrar e reviver esses momentos tensos, porém prazeirosos por ter a oportunidade de ter feito parte dessa história.
ResponderExcluirParabéns pelo belo relato. Até hoje eu guardo o cartaz de um dos primeiros shows q eles deram juntos em BH no Ginástico.
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